ACIDENTE DE TRÂNSITO ENTRE VEÍCULOS: DE QUEM É A CULPA
Sabemos que dirigir requer cuidado, pois o trânsito nos exige atenção constante. Além disso, a própria legislação vigente impõe algumas regras importantes sobre a responsabilidade de cada condutor para com terceiros, enquanto estiver dirigindo.
A primeira previsão legal que evidencia a necessidade de se estar atento ao dirigir está no art. 28 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), que diz: “O condutor deverá, a todo momento, ter domínio de seu veículo, dirigindo-o com atenção e cuidados indispensáveis à segurança do trânsito.”
Isso significa que aquele motorista que não se dedicar atentamente ao trânsito enquanto estiver dirigindo, estará colocando em risco a vida dos demais motoristas e pedestres, além de estar desobedecendo a lei, de modo que a culpa por eventual acidente poderá ser imputada a ele.
O CTB vai além para não deixar dúvidas quanto a responsabilidade dos motoristas, dando uma orientação mais objetiva de como os condutores devem agir para evitar acidentes, prevendo no art. 29, inciso II, o seguinte: “O trânsito de veículos nas vias terrestres abertas à circulação obedecerá às seguintes normas: II – o condutor deverá guardar distância de segurança lateral e frontal entre o seu e os demais veículos, bem como em relação ao bordo da pista, considerando-se, no momento, a velocidade e as condições do local, da circulação, do veículo e as condições climáticas.”
Portanto, fica claro que todos os condutores de veículos que transitam em vias terrestres têm a responsabilidade compartilhada de manter o trânsito em ordem e seguro. Entretanto, quando ocorre um acidente nem sempre é fácil identificar quem deixou de observar os cuidados necessários.
Assim, imaginemos uma situação: o condutor A está dirigindo e bate na traseira do carro do condutor B e este busca o Poder Judiciário para demandar o condutor A, em razão dos danos causados ao seu veículo.
Nessa situação, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), justamente a partir dos artigos ora mencionados, fixou o entendimento de que em caso de acidente resultante da colisão entre veículos automotores, deverá se presumir a culpa daquele que bateu na traseira do veículo colidente, de modo que este arcará com o ônus de provar que não lhe cabe a responsabilidade.
A título de exemplo, comprova a adoção dessa tese o julgado a seguir:
CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO NA TRASEIRA DO VEÍCULO. PRESUNÇÃO DE CULPA.1. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “culpado, em linha de princípio, é o motorista que colide por trás, invertendo-se, em razão disso, o onus probandi, cabendo a ele a prova de desoneração de sua culpa” (REsp nº 198.196, RJ, relator o eminente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, publicado no DJ de 12.04.1999).Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 535627 / MGAGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2003/0050745-5 Ministro ARI PARGENDLER, T3 – TERCEIRA TURMA- DJe 05/08/2008)
Ou seja, nos casos em que não seja possível esclarecer quem de fato causou o acidente, o condutor que estiver na frente, e, portanto, tiver sua traseira atingida, terá para si a presunção de não ter causado o acidente, enquanto aquele que sofreu a colisão frontal, terá para si a presunção de culpa.
Isso se dá porque, para o STJ, o art. 29 obriga o condutor a manter- se em uma distância segura dos demais veículos que o rodeiam, e a colisão frontal é um indicativo da inobservância do dever de cautela que esse dispositivo legal impõe.
Além disso, é muito importante ter em mente que não é somente o condutor do veículo que bater na traseira do outro que responderá em relação aos eventuais danos.
O STJ de forma pacífica considera solidária e objetiva a responsabilidade do proprietário do veículo para com o motorista que causou o acidente, conforme se vê no recente julgado:
AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DEVER DE INDENIZAR.PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA.PRECEDENTES. SÚMULA 83/STJ. VALOR INDENIZATÓRIO. REDUÇÃO DOS HONORÁRIOS. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ATENDIDOS OS CRITÉRIOS ESTABELECIDOS NO ART. 85, § 11, DO CPC/2015. INCIDÊNCIA DA TAXA SELIC. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. MULTA PREVISTA NO ARTIGO 1.021, § 4°, DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
NÃO INCIDÊNCIA. 1. Pacífico o entendimento, neste Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o proprietário responde objetiva e solidariamente pelos atos culposos de terceiro que conduz automóvel envolvido em acidente de trânsito. Precedentes. Incidência da Súmula 83/STJ. 2. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória (Súmula 7/STJ) […]6. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1533886 / SP- Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, T4 – QUARTA TURMA – Data de julgamento: 01/06/2020; Publicação: DJe 05/06/2020)
Desse modo, quando for reconhecida a culpa do condutor pelos danos causados a terceiro, seja de forma presumida ou efetivamente provada pela parte, o proprietário do veículo que o tenha emprestado responderá na mesma medida e independente de ter qualquer envolvimento no acidente.
Visando garantir que a parte lesada seja ressarcida pelos danos sofridos, essa imputação objetiva não pressupõe qualquer vínculo empregatício entre o proprietário do veículo e o condutor, o que significa que a responsabilidade decorre tão somente do fato de automóveis serem veículos perigosos, de modo que quem o empresta, assume o risco de eventual acidente.
Diante dessas considerações, devemos sempre ter em mente que ao dirigir um automóvel ou emprestá-lo a terceiro, estamos assumindo muitas responsabilidades. Portanto, atenção ao dirigir não é só uma precaução ou uma medida de autocuidado, é um dever imposto pela lei, e sua inobservância acarreta sérias consequências que atingirão não somente o condutor, mas também o proprietário do veículo.