BENEFÍCIOS ASSEGURADOS ÀS PESSOAS IDOSAS NOS TRANSPORTES COLETIVOS
Como é cediço, o caput do art. 230 da Constituição Federal assegura especial proteção aos idosos, ao estabelecer que "a família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida."
Uma dessas formas de amparo é prevista no próprio § 2º do referido art. 230 da Carta Federal, ao garantir aos maiores de sessenta e cinco anos a gratuidade nos transportes coletivos urbanos. A matéria também é tratada no Estatuto da Pessoa Idosa (Lei nº 10.741/03), que aborda a temática em seus artigos 39 e 40, estabelecendo distinções entre os benefícios concedidos no transporte urbano e no interestadual.
Consoante o art. 39 do Estatuto em análise, tratando-se de transporte coletivo público urbano e semi-urbano, a gratuidade é assegurada aos maiores de sessenta e cinco anos, e está condicionada tão somente a apresentação de qualquer documento pessoal hábil a comprovar a idade, não havendo, portanto, qualquer necessidade de comprovação de renda ou limite de vagas.
Ainda de acordo com o § 3º do dispositivo em tela, no caso das pessoas compreendidas na faixa etária entre sessenta e sessenta e cinco anos, cabe à legislação local disciplinar a forma de exercício da gratuidade nos meios de transporte, de modo que a gratuidade estará condicionada aos requisitos estabelecidos na legislação local.
Em Cuiabá/MT, por exemplo, o tema é atualmente tratado na Lei Municipal nº. 6.358/19, que assegura a gratuidade no transporte às pessoas compreendidas na faixa etária de sessenta a sessenta e cinco anos que possuam o "Cartão Melhor Idade", concedido exclusivamente àqueles que residem na Capital Mato-grossense.
Já em relação ao transporte interestadual, a gratuidade está condicionada à presença de outros requisitos. Isso porque, nos termos do art. 40 do Estatuto da Pessoa Idosa, para além da idade superior a sessenta e cinco anos, é preciso comprovar renda igual ou inferior a dois salários-mínimos, requisito que não é exigido para concessão da gratuidade no transporte coletivo urbano.
Para além disso, a gratuidade no transporte coletivo interestadual também está limitada ao número de duas vagas por veículo, sendo certo que, caso findas as vagas gratuitas, a pessoa idosa fará jus a, no mínimo, cinquenta por cento de desconto na aquisição das passagens.
O tema também é disciplinado por leis estaduais. No caso do estado de Mato Grosso, por exemplo, a Lei nº 8.823/08 prevê, em seu arts. 2º e 3º que o benefício será assegurado aos maiores de sessenta anos, bem assim como aos aposentados e pensionistas, desde que não apresentem rendimentos mensais superiores a dois salários mínimos.
Oportuno pontuar, nesse aspecto, que os assentos destinados à gratuidade devem ser devidamente identificados, e não podem ser comercializados, mesmo se os lugares estiverem vagos.
Por fim, cumpre ainda mencionar que, segundo entendimento do Eg. Superior Tribunal de Justiça, a gratuidade deve ser plena, sendo incabível a exigência de pagamento das tarifas de pedágio e de utilização de terminal, veja-se:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IDOSO. TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERESTADUAL. VAGAS GRATUITAS. ISENÇÃO TARIFÁRIA. DECRETO REGULAMENTAR EIVADO DE ILEGALIDADE. INDEVIDA INOVAÇÃO NO PLANO LEGISLATIVO. EXCESSO NA REGULAMENTAÇÃO. RECURSOS ESPECIAIS AOS QUAIS SE NEGA PROVIMENTO.
1. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal objetivando declarar a nulidade do parágrafo único do art. 8o. do Decreto 5.943/2006, bem como do parágrafo único do art. 6o. da Resolução 1.692 da ANTT, de forma a garantir a gratuidade do transporte interestadual conferida ao idoso, nos termos do art. 40, I da Lei 10.471/2003.
2. A controvérsia apresentada pelos recorrentes cinge-se em saber se o direito do idoso a duas vagas gratuitas, no transporte interestadual, compreende, além do valor das passagens, as tarifas de pedágio e de utilização dos terminais rodoviários. Vale dizer, se a gratuidade abrange tais valores, o disposto no Decreto 5.943/2006 e na Resolução 1.692 da ANTT estão eivados de nulidade, por extrapolar o Poder Regulamentar.
3. A gratuidade do transporte, ao idoso, vale lembrar, não foi estabelecida somente pela Lei 10.741/2003; encontra, antes disso, suporte constitucional. Nota-se, nesse particular, que o constituinte teve especial atenção ao transporte dos idosos, considerando tratar-se não só de um direito, mas de verdadeira garantia, que tem por escopo, além de facilitar o dever de amparo ao idoso, assegurar sua participação na comunidade, bem-estar e dignidade, conforme o disposto nos arts. 229 e 230 da Constituição Federal.
4. Ao reservar 2 vagas gratuitas por veículo para idosos com renda igual ou inferior a 2 (dois) salários-mínimos, o Estatuto do Idoso não estabeleceu qualquer condicionante além do critério de renda a ser observado. Desse modo, considerando os fins sociais a que se dirige a norma, o dever de amparo ao idoso, a necessidade de assegurar sua participação na comunidade, seu bem-estar e dignidade, bem como a inviolabilidade da integridade psíquica e moral (art. 10, § 2o. da Lei 10.741/2003), a gratuidade do transporte interestadual prevista no art. 40, I do Estatuto do Idoso, resulta na dispensa de pagamento das tarifas de pedágio e de utilização dos terminais.
5. Com efeito, o Decreto 5.943/2006, fulcrado no art. 84, IV da CF/1988, a pretexto de regulamentar o disposto do art. 40 do Estatuto do Idoso, exorbita o poder regulamentar, apontando ressalvas/condicionantes não previstas na legislação, sendo, portanto, nulo o parágrafo único do art. 8o. do mencionado Decreto.
6. Ressalte-se, por fim, que não tem lugar a almejada interpretação do inciso I do art. 40, com a previsão do respectivo inciso II, que garante o desconto, de forma expressa, no valor da passagem. A reserva de 2 (duas) vagas gratuitas por veículo para idosos com renda igual ou inferior a 2 (dois) salários-mínimos, conforme já consignado, não se limita ao valor das passagens, abrangendo eventuais custos relacionados diretamente com o transporte, onde se incluem as tarifas de pedágio e de utilização dos terminais. Desse modo, deve-se garantir ao idoso com reduzido poder aquisitivo (renda igual ou inferior a 2 salários-mínimos) a dispensa do pagamento de valor que importe em obstáculo ao transporte interestadual, de forma a conferir a completa efetividade à norma.
7. Recursos Especiais aos quais se nega provimento, em conformidade com o parecer do Ministério Público Federal.
(REsp n. 1.543.465/RS, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 13/12/2018, DJe de 4/2/2019.) Ante o exposto, resta evidenciado que o direito à gratuidade nos transportes coletivos varia a depender do âmbito em que realizado, sendo necessário considerar o estabelecido nas legislações estaduais e municipais, as quais, por certo, não poderão erigir requisitos não previstos na Constituição Federal ou no Estatuto da Pessoa Idosa.