Considerações acerca do direito à imagem
Previstos no Capítulo II do Título I do Código Civil de 2002, nos artigos 11 a 21, os direitos da personalidade são fruto da captação dos direitos fundamentais e contemplam os atributos da personalidade merecedores de proteção jurídica, visando tutelar a condição humana em seus aspectos essenciais. Carlos Alberto Bittar, nesse contexto, afirma que os direitos da personalidade são aqueles reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade.
Nesse sentido, o direito à imagem configura um importante direito personalíssimo, resguardando o aspecto interior do indivíduo, consistindo em uma expressão da personalidade humana, de titularidade do próprio indivíduo, capaz de representá-lo no meio social. Há, também, uma diferenciação entre imagem-retrato, caracterizada como representação física da pessoa, isto é, a fisionomia desta, e a imagem-atributo, aquela relacionada à soma de qualidades do indivíduo.
Desse modo, conforme extraído do artigo 20 do Código, torna-se indispensável, em regra, a autorização do titular do direito para que haja a veiculação de sua imagem, sendo assegurado o direito à reparação em caso de lesão ou de uso indevido. No que tange à reparação moral referente aos casos de lesão, o Superior Tribunal de Justiça editou, em novembro de 2009, a Súmula n. 403, prevendo que nos casos de uso indevido da imagem com fins econômicos ou comerciais, o dano moral é presumido. Mesmo que tenha havido uma limitação da proteção do direito à imagem a hipóteses vinculadas a fins comerciais, a ofensa à imagem pode ocorrer independentemente da sua destinação comercial, conforme dispõe Anderson Schreiber.
Entretanto, cabe mencionar que existem situações, embasadas pela própria Constituição, que legitimam a divulgação não autorizada da imagem alheia. Um dos principais exemplos está na colisão entre o direito à imagem e o direito à liberdade de expressão. Nesses casos, deve-se realizar uma ponderação minuciosa entre esses dois direitos, que possuem igual proteção na ordem jurídica, para avaliar qual deve prevalecer na situação específica em análise.
Por fim, nos casos de pessoas públicas, a exemplo de políticos e celebridades, torna-se comum conflitos envolvendo a imagem destes, visto que naturalmente já são figuras mais midiáticas do que os demais indivíduos, como no caso envolvendo a atriz Maitê Proença. A atriz fez um ensaio fotográfico para a revista Playboy, autorizando, assim, a publicação de fotografias onde aparecia nua. No entanto, ocorreu que as mesmas fotografias foram divulgadas por um jornal carioca com grande circulação, sem que houvesse o consentimento da atriz para tanto.
Ao promover uma ação judicial por danos materiais e morais em razão do uso indevido de sua imagem, o pedido de indenização por dano moral foi rejeitado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que se utilizou de argumentos no sentido de que apenas mulheres ditas “feias”, dentre demais caracterizações utilizadas na decisão, poderiam se sentir humilhadas ou constrangidas em ter a divulgação de fotos suas desnudas estampadas em jornais ou em revistas. Logo, segundo a referida decisão, Maitê Proença, por ser uma mulher tida como “bonita”, não teria como justificar uma indenização por danos morais, visto que o dano moral não teria ocorrido.
Posteriormente, a decisão foi acertadamente reformada por meio de acórdão do Superior Tribunal de Justiça (Recurso Especial 270.730 / RJ, 20/12/2000), que afirmou que “A publicação desautorizada de imagem exclusivamente destinada a certa revista, em veículo diverso do pretendido, atinge a honorabilidade da pessoa exposta, na medida em que experimenta o vexame de descumprir contrato em que se obrigou à exclusividade das fotos.”.
Assim, resta claro que todos os indivíduos, independentemente do grau de reconhecimento que possuem perante a sociedade, devem conservar de forma integral o seu direito à imagem, como manifestação irrenunciável da sua própria condição humana, assim como os demais direitos da personalidade.
Referências bibliográficas
BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.
SCHREIBER, Anderson. Direitos da Personalidade. São Paulo: Atlas, 2014.
TARTUCE, Flávio. Direito Civil, v. 1: Lei de Introdução e Parte Geral. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016.