DIREITOS DAQUELE QUE SEMEIA, PLANTA OU EDIFICA EM SOLO ALHEIO
Neste artigo trataremos, ainda que de maneira não exaustiva, dos direitos daquele que planta e/ou edifica em solo alheio, isto é, em terreno que não é de sua propriedade. De início, importa pontuar que tal edificação pode ocorrer de maneiras distintas, sendo igualmente diversas as soluções jurídicas.
Necessário ressaltar, desde já, que se a edificação não for autorizada pelo proprietário do imóvel, tem-se, a princípio, verdadeira hipótese de turbação ou de esbulho, caso em que poderá o titular do direito de propriedade ajuizar ação reivindicatória, a fim de reaver a posse do bem (art. 1.228 do Código Civil) - também são cabíveis ações possessórias, a depender das peculiaridades do caso concreto, que indicarão a medida mais adequada -, não havendo necessidade de indenizar, se aquele que edificou não agiu de boa-fé.
Diversa é a situação quando aquele que constrói em solo alheio já exerce posse ad usucapionem do lote. Nesse cenário, a edificação é verdadeira extensão da posse mansa e pacífica que já é exercida sobre o bem, razão pela qual, em casos tais, quem edifica pode ingressar com uma ação de usucapião - desde que preenchidos todos os requisitos legais - a fim de haver a propriedade do bem para si, a qual será adquirida a título originário.
Caso distinto, no entanto, ocorre quando o proprietário do imóvel autoriza que se edifique no terreno - o que na prática costuma ser feito verbalmente -, cedendo o uso do bem a um familiar ou amigo, para que construa no imóvel e usufrua do bem.
É certo que, nesses casos, a autorização do proprietário não configura doação do lote, especialmente em razão da exigência legal de que a doação de bens imóveis deve ser feita por escritura pública ou instrumento particular (art. 541 do CC) - sendo certo que, caso o valor do imóvel seja superior a trinta salários-mínimos, a escritura pública passa a ser indispensável (art. 108 do CC).
Ademais, ainda nesse ponto, importa esclarecer que essa posse, autorizada pelo proprietário, advém, em verdade, de um comodato verbal, o que impede, por conseguinte, que se possa falar de posse ad usucapionem, ante a ausência de animus domni.
Sendo assim, considerando a situação hipotética em tela - nada distante da realidade -, o que pode pretender receber aquele que, de boa-fé, plantou e/ou edificou em solo alheio quando o proprietário deseja reaver o bem?
Em primeiro lugar, é preciso pontuar que, durante o comodato, os frutos percebidos, caso não haja disposição diversa entre as partes, serão amealhados por aquele que semeou ou edificou. Findo o empréstimo do solo, aquele que plantou e/ou construiu poderá requerer a indenização pelos gastos que comprovadamente despendeu para edificar o bem.
Nesse ponto, possivelmente, reside a maior dificuldade daqueles que edificam em solo alheio. Isso porque, não raro, o bem é construído ao longo dos anos, sem um controle rígido dos investimentos feitos na edificação, de modo que, ao fim, nem aquele que edificou sabe exatamente quanto foi gasto, e tampouco tem como comprovar o que acredita ter gastado, o que acaba inviabilizando a indenização integral pelos investimentos realizados.
Oportuno pontuar que, nesses casos, não pode aquele que edificou pretender a avaliação do bem para que, posteriormente, considerando os valores presumidamente gastos na construção, possa ser indenizado. Isso porque a Lei Civil expressamente dispõe que a indenização será correspondente ao que foi comprovadamente gasto por aquele que edificou (art. 1.255). Além disso, ainda segundo o Código Civil, os gastos para edificação no imóvel são presumidamente despendidos pelo proprietário (art. 1.253), que faz jus a toda acessão realizada no solo do bem que esteja sob seu domínio, até que se prove o contrário.
Pode ser mencionada, ainda, uma terceira razão. É que eventual avaliação do valor de mercado do bem não guarda nenhuma relação com a quantia gasta por aquele que pretende ser indenizado, uma vez que o bem pode ter sido edificado por mais de uma pessoa, não podendo aquele que almeja a indenização receber o valor correspondente ao total dos gastos para edificar o bem.
Para além disso, o valor atual do bem não guarda relação com os custos para sua edificação, não podendo aquele que edificou pretender auferir o equivalente a eventual valorização do imóvel. Nesse aspecto, também não pode ser considerado o valor que seria gasto atualmente para construir o bem, haja vista que o valor dos materiais e da mão de obra varia ao longo do tempo, não podendo presumir que o que seria gasto atualmente guarda íntima relação com o que foi efetivamente gasto à época.
Sendo assim, em suma, o que se observa é que a indenização não pode ser pleiteada com base em presunções ou alegações carentes de comprovação, sendo imprescindível que aquele que pretende ser indenizado efetivamente comprove quanto despendeu na construção, pois o valor comprovado é que será considerado.
Caso o valor comprovadamente gasto seja muito superior ao do terreno, aquele que edificou e/ou semeou poderá adquirir a propriedade do bem para si, desde que indenize aquele que era, até então, o proprietário do solo (art. 1.255, parágrafo único do CC).
Em conclusão, aquele que edifica em solo alheio deve ter muita cautela, estar ciente dos riscos que corre, e se precaver, na medida do que for possível no caso concreto, especialmente mantendo rígido controle dos gastos na construção do bem, a fim de que possa ser ressarcido futuramente em caso de eventual encerramento do comodato.