DISPUTE BOARDS: PREVENÇÃO E ADMINISTRAÇÃO DE CONFLITOS
Os ditos meios alternativos de resolução de conflitos - especialmente arbitragem, conciliação e mediação - tem assumido, nos últimos anos, papel de destaque na administração de controvérsias, por possibilitarem, na maior parte das vezes, que os conflitos sejam dirimidos com brevidade - além de outros benefícios. Nada obstante, conquanto instrumentos eficazes, nenhum dos mecanismos expostos acima atua na prevenção de controvérsias. É justamente esse o diferencial dos Dispute Boards.
O Comitê de Prevenção e Solução de Disputas, internacionalmente conhecido como Dispute Board, está previsto, em âmbito federal, no art. 151[1] da Lei nº14.133/2021 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos), como um dos meios de prevenção e solução de controvérsias oriundas dos contratos regidos pela lei em questão - não há, até o momento, regulamentação federal sobre a matéria.
O Comitê tem a função de dirimir controvérsias que exsurjam ao longo da execução do contrato, atuando de diferentes maneiras a depender do estipulado pelas partes no instrumento contratual. Isso porque o Comitê poderá ter natureza revisora, adjudicativa ou híbrida. No primeiro caso, as recomendações expedidas não serão vinculantes, podendo as partes adotá-las ou não. Por outro lado, caso conferida natureza adjuticativa ao Comitê, as decisões devem ser necessariamente observadas pelas partes em litígio. Outrossim, quando atribuída natureza híbrida, algumas decisões serão vinculantes e outras não, nos moldes do que for estabelecido contratualmente. Ressalte-se que, em quaisquer dos casos, as decisões do Comitê poderão ser revistas judicialmente ou por tribunal arbitral, caso existente cláusula compromissória ou compromisso arbitral.
No Brasil, o pioneiro na regulamentação do tema foi o Município de São Paulo/SP, que editou a Lei nº 16.873/2018, regulamentada pelo Decreto Municipal nº 60.067/2021. Segundo o referido diploma legislativo, os comitês de resolução de controvérsias serão compostos por três membros imparciais, preferencialmente dois engenheiros e um advogado, franqueada a indicação de uma instituição especializada para instituir e processar o Dispute Board.
Os Comitês, nos termos da legislação municipal em tela, são competentes para dirimir conflitos atinentes a direitos patrimoniais disponíveis que vierem à tona ao longo da execução de contratos públicos, desde que o valor da avença seja igual ou superior a R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de reais), e conste tal previsão no edital de licitação e no contrato celebrado.
Por certo, como se pode imaginar, os Comitês de resolução de disputas assumem papel primordial no âmbito dos contratos de longa duração, como os que tenham por objeto a realização de obras de grande porte ou concessões - em suas diversas modalidades. Nesses casos, o Comitê atua desde o início da execução do contrato, dirimindo, com autoridade técnica, conflitos que frequentemente surgem no decorrer de contratos de tamanha complexidade, com o intuito de evitar que eventuais divergências entre as partes comprometam o regular cumprimento do contrato.
Consoante destacado, é justamente esse o elemento que diferencia os Dispute Boards dos demais meios de resolução de conflitos. Nesse aspecto, ressalta-se que que por atuarem na prevenção de controvérsias, acompanhando de perto a execução do contrato, a expedição de recomendações e decisões é feita com mais propriedade de causa, ante a familiaridade do Comitê com o tema controvertido.
A respeito do tema, um estudo realizado em 2018 pelo Dispute Resolution Board Foundation, tendo por amostra 230 contratos que previam a adoção dos Dispute Boards, verificou que em 94% (noventa e quatro por cento) dos casos não foi necessário utilizar outros procedimentos de resolução de disputas além dos Comitês, evidenciando o alto índice de sucesso do método de administração de conflitos em questão[2] .
Além da alta taxa de êxito, os Dispute Boards, segundo a instituição mencionada, apresentam um baixo custo de manutenção, representando, geralmente, um gasto entre 0,05 e 0,15% das despesas totais do contrato, o que evidencia um extraordinário custo x benefício na utilização do meio de resolução de controvérsias em questão.
É certo que o instrumento ainda está começando a ser utilizado no país, e certamente irá ganhar ainda mais relevância no cenário nacional, notadamente por ser exigência do Banco Mundial a utilização dos Comitês para que sejam concedidos empréstimos superiores a US$ 50 milhões, o que se justifica em razão dos Dispute Boards também funcionarem como importante mecanismo de transparência e publicização da execução contratual, facilitando o controle dos recursos empreendidos.
REFERÊNCIAS
[1] "Art. 151. Nas contratações regidas por esta Lei, poderão ser utilizados meios alternativos de prevenção e resolução de controvérsias, notadamente a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas e a arbitragem. Parágrafo único. Será aplicado o disposto no caput deste artigo às controvérsias relacionadas a direitos patrimoniais disponíveis, como as questões relacionadas ao restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ao inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das partes e ao cálculo de indenizações."
[2] Disponível em: < https://www.conjur.com.br/2021-mai-18/polidoro-dispute-boardopcao-disputas-altacomplexidade#:~:text=Dispute%20board%20%C3%A9%20boa%20op%C3%A7%C3% A3o%20para%20resolu%C3%A7%C3%A3o%20de%20disputas%20de%20alta%20complexidade&text=A%20Lei%20de%20Media%C3%A7%C3%A3o%20(Lei,a%20um% 20Poder%20Judici%C3%A1rio%20abarrotado. >. Acesso em: 14/04/2022.